domingo, 17 de maio de 2009

Clintisvudi Perera

Clintisvudi Perera estava há dias debruçado sobre livros e mais livros, varando noites sem dormir, se alimentando mal, digo, praticamente não se alimentando, às voltas para responder as três últimas questões da sua tese de doutorado em Psicologia Espacial das Massas, aplicada especificamente a faquires indianos, à qual dera o título bem sugestivo de “Como sobreviver jejuando em meio à crise, sobre uma cama de pregos e sem beber nenhum líquido por 150 dias, exposto ao público, dentro de uma cápsula com paredes e tampa de acrílico transparente, com vigias de uma empresa séria de consultoria do Bairro Manipulo e imprensa presente 24 horas por dia”.

As três respostas eram fundamentais para a conclusão dos seus escritos, a sua parte final, The great conclusion, como ele gostava de pensar. Pensava igualmente que após o recebimento do diploma, ganharia também uma coroa de louros... Não, de louros, não! Haveria de ser uma de ouro, projetada para ser colocada sobre a sua cabeça em ato que seria oficializado e comemorado com um enorme foguetório no calçadão da Olvredo Uóteli. Não faltariam discursos inflamados frente a uma multidão de mais de dez mil pessoas, que o louvariam e o aplaudiriam freneticamente, gritando, melhor dizendo, berrando o seu nome – Clintisvuuuudi! Clintisvuuuudi! Clintisvuuuudi! –, numa gritaria que beiraria a histeria, e tudo apenas como parte das homenagens, pois ainda viriam os prêmios que lhe haviam sido prometidos e a que ele faria jus quando concluísse o curso – a Casas Acarajé havia lhe prometido uma cama de solteiro novinha, completa, com colchão e travesseiro de espuma. Ficaria conhecido internacionalmente, graças a diversos vídeos feitos por espertos fotógrafos amadores com suas fotomachines, cujos vídeos acabariam sendo exibidos no YouTube. Tornar-se-ia um ícone pelo produto intelectual de verdadeiro conhecedor de assunto sobre o qual ninguém ainda se aventurara, mas que ele resolvera enfrentar e conseguira desvendar.

A princípio, era todo felicidade e estava certo de que seria a maior moleza. Tema fácil, que ele tiraria de letra! Mas se enganara redondamente e estava encontrando imensas dificuldades para fornecer às perguntas respostas condizentes com suas importâncias. Não encontrara nada no Google a respeito nem nenhuma referência nos escritos de Freud em mais de cinqüenta livros da biblioteca da sua universidade. Não tinha ainda nenhuma pista, estava a zero no questionamento com o quê se deparara, o dia da apresentação da tese se aproximava. Não tinha ninguém que pudesse auxiliá-lo e ele era só, morava sozinho, num kitinete da Alpino de Alweida. Nada de amigos, professores, cachorro, tampouco namorada, que viesse com uma dica salvadora, dar-lhe ou indicar-lhe o pulo do gato, por mais simples que fosse.

Permanecia num estado de nervosismo constante e crescente, arrancava cabelos da sua já parca cabeleira de tanta raiva, falava sozinho o tempo todo, se maldizia pela sua ignorância, xingava a faculdade, xingava o curso, xingava os professores, o papa, o padre, o pastor daquele igreja evangélica, o dono do seu botequim predileto e as pessoas que ele via do alto do edifício onde morava. Estava entrando... Estava entrando, não! Já havia entrado e estava atolado até o último fio de cabelo dentro de um estado de angústia que o aprisionara e do qual ele não iria escapar, face ao que se tornara um problema intransponível para o seu grau de conhecimento e paciência. No decorrer da quarta semana, sem ter escrito nenhuma linha, não resistiu: pulou da janela do 31º andar do prédio, espatifou-se na calçada espalhando tripas, miolos e sangue pra tudo quanto é lado. Não! Não espalhou bosta, não! Fazia três semanas que não comia nada, só bebia guaraná Pantiquêra.

No enterro dos seus restos mortais, jogados dentro de um saco de cimento Tupi com a tampa amarrada com um arame enferrujado, não foi ninguém. Sua família morava longe, muito longe, não teria dinheiro para cobrir as despesas da viagem. Jamais ficou sabendo do destino dele.

Tadinho! Mas deixemos isso pra lá porque, afinal, isso foi problema dele e não nosso, e um dos piores defeitos das pessoas internetadas que não têm o que fazer é ficar escrevendo bobagens sobre a vida alheia, quanto não possuem ou não lhes vêm à cabeça uma idéia inovadora, consistente, gostosa de se ler e útil e motivadora de uma discussão realmente saudável, que traga de maneira efetiva benefícios para toda a humanidade. Como eu!

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- I bibida prus músicus!

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